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• Eu, menino, não sabia como fazer da fala daquele senhor uma bússola para me safar do enigma que era percorrer seu sítio, cheio de armadilhas e pegadinhas. Acho que naquela época, não me importava muito se iria conseguir me safar daquele labirinto, que me deixava inquieto a completá-lo. Uma missão kamikaze, como se o fim não me preocupasse muito. Somente o momento e a intenção é que mexiam com a possibilidade, alcançar o que aquele velho balbuciava.
• Acho que não tinha muita paciência para escutá-lo, e, de certa forma, isso me fez bem. Não estava querendo mais saber como ele funcionava, mas sim, como posso eu funcionar nele. Um sopro e já estou do outro lado, puxado por uma alavanca que não esperava me alcançar e lançado contra a parede. Ele tinha avisado. O velho é sábio, mas como eu, não é perfeito. Contra a parede, me sinto ele, de peito no concreto, seu corpo.
• A partir do momento em que me vi incrustado em sua casca, sabia que podia acompanhá-lo. E ele me levou pra bem longe dalí. Num lugar onde nenhum dos dois conseguia distinguir qual domínio pertencia a quem. Éramos um só. E ele, algo que já está, parecia me guiar. Não necessariamente por ele próprio, mas por forças que passavam nele, e que nele eram canalizadas. Poderia ser um vento, mas a princípio, uma energia que mesmo titubeando me fazia tremer pela capacidade de transformar algo invisível em materialidades cromáticas delirantes. Ao mesmo tempo que, por mais colorido e vívido que ele pudesse ser, conseguia se transformar em algo invisível. Uma mecanicidade para ser e desaparecer, num simples sopro.
• A ferramenta não me importava mais. A forma como ele é sutil e ingênuo, não se faz perceber frente a todo poder de catarse. Nele as coisas aconteciam com leveza e elegância. Em todas as suas imperfeições, ele me cristaliza em sua forma de fazer girar e permanecer em pé, um estado de sanidade que sempre está colocada em cheque pelo enlouquecer das coisas. Os elementos que se mostravam disponíveis para ele, não precisavam se limitar a uma faísca específica. Seu movimento sempre está assegurado pelos éolos que ali guardam há um tempo, a permanência daquele giro que se pretende perfeito. Ele não era pretensioso, mas sua magnitude falha o fazia cheio de maravilhas a se perceber. Ele é infantil e violento. Sutil e agressivo. Visível e invisível. Velho e jovem. Um novo que é velho e, pela magia de encontrá-lo, se faz vivo novamente e te torna refém de suas experiências com a morte inevitável, mostrando o fim: só uma passagem. A forma do velho que era simplesmente objetual, se perdeu. O que ele traz é a confusão entre a naturalização e a artificialização. Um ser que faz girar e perder seu controle, na rigidez com que se enfinca na terra de um jardim qualquer.

-Bruno Magliari

edição: Isabela Equor
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Entre no portão recém pintado de preto com numeração 725, siga pela garagem e pelo primeiro corredor à sua direita. Suba as escadas até o segundo andar e entre na sala. Ali o esqueleto de uma antiga fábrica é preenchido pelo vento que sopra durante o dia. Nesse sítio, a corrente de ar circunda e atravessa todos os seus cantos. A luz caminha sobre o chão e as paredes do espaço. A energia que ali habita é trazida pelos ventos que sopram junto a luz solar, que vai evidenciando cada pedaço dessa paisagem.
Lembro de algo parecido quando era criança, que me fazia querer vagar. Não sabendo onde ia parar, vontade de conhecer aquilo que não conseguia ver. Fazia-me perder, Tanto criava quanto tentava achar formas de sair desse labirinto. Brotava no corpo essa vontade de achar o desconhecido. Eu traçava num compasso um círculo de cada vez, e a cada um que fazia, me distanciava mais do último que já estava feito. Mesmo sabendo que pelo último, já tinha percorrido. Uma brincadeira de tentar alcançar cada canto daquele lugar o mais rápido possível. Ficava encantado pela ansiedade que me preenchia quando me deparava com aquele espaço. Não sabia muito como me portar naquele pedaço de chão que indicava para me distanciar:


Sai menino, aqui não é lugar de brincadeira!!- ele falava

Não sabia, pensando agora, se uma onda de mania me fazia motivado a correr o risco de tropeçar e cair num buraco finito, só pra buscar algo que não sabia com certeza existir. A ganância por saber no que dá, falava mais alto do que aquele velho senhor que me alertava de sua própria vivência. Ele, naquela existência corroída e duvidosa, me encantava, mas ao mesmo tempo me impulsionava a desafiá-lo.
Senhor estranho, nem tão velho assim, mas com uma aparência passado. Até mesmo a loucura clínica parecia já estar fundida nas vísceras de teu corpo; nele também, já parecia ter habitado uma produção fabril, o que pra mim, naquela época de criança, se assemelhavam. Algo tão sútil que, que pelo seu teor, quase é possível esquecer de seu teor violento. Mas a violência não conseguia passar despercebida. Todas cicatrizes expostas ao sol, não deixavam sarar. Ele ficava ali exposto a qualquer tipo de interferência que nele atravessasse. A mais fraca carga de movimento já o fazia mexer, num ritmo que só quem esteve por lá sentiu seu giro funcionar. E nele os movimentos de direção pareciam não mais ter controle, mas sim eram induzidos por uma corrente que o fazia rodar. Apesar de sua aparência simetricamente rígida, o velho dizia:


Para sair daqui, só girando no sentido que te peço! E no meu desejo tu encontra o teu para sair desse lugar, ainda que querendo saciar sua sede de me conhecer.

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